Cientistas criam dispositivo implantável que poderá facilitar vacinação de peixes
A ideia com a nova tecnologia é gerar uma imunidade contínua aos peixes com apenas uma dose de imunizante; dessa forma, seria possível reduzir custos para o produtor e ainda gerar menos estresse aos animais
Você sabia que os peixes tomam vacinas? Assim como os seres humanos, outros animais também contam com esse tipo de prevenção a doenças. Porém, vacinar peixes e outros seres aquáticos dá muito mais trabalho. Imagina capturar cada animal criado em um tanque com milhões da mesma espécie? Essa tarefa complexa, que precisa ser repetida a cada nova dose necessária, demanda ao produtor muita mão de obra, planejamento, controle, tempo e custos elevados. Mas essa realidade está perto de passar por uma revolução graças a um novo dispositivo implantável de apenas 1cm de comprimento e 2mm de diâmetro. A invenção, criada por pesquisadores da Unesp, em Jaboticabal, poderá gerar imunidade contínua ao peixe, dispensando a aplicação de novas doses.
O pesquisador Gabriel Conde, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da Unesp, explica que o dispositivo inovador leva para dentro do corpo do animal bactérias inativadas responsáveis por causar doenças. Quando o organismo identifica aquela peça estranha, tem início um processo inflamatório. “As células de defesa vão até o local e começam a degradar o dispositivo e ter contato com a bactéria inativada que estava encapsulada. Desta forma, o sistema imunológico começa a produzir anticorpos contra aquela bactéria. Os primeiros resultados mostram que houve a produção de anticorpos no mesmo nível das vacinas usadas comercialmente. Enquanto o dispositivo não for degradado por inteiro, o que pode levar até dois anos, o corpo continua sendo estimulado a fabricar essa defesa”, relata.
A tecnologia, que foi patenteada junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), com apoio da Agência Unesp de Inovação (AUIN), é feita com um polímero natural chamado Poli (ácido lático). Trata-se de um material compatível com o corpo do animal, que vem sendo pesquisado em diferentes áreas do conhecimento.
O grupo de especialistas da Unesp já realizou seis estudos que mostram que o polímero não apresenta perigo ou contraindicação, além de ser absorvível e biodegradável. O novo método, que vem sendo testado em peixes em parceria com o Instituto Butantan, pode ser aplicado em diferentes animais, é capaz de facilitar e baratear o processo de imunização e ainda pode ser usado para liberar diversas substâncias de forma controlada, similar ao popularmente conhecido “DIU”, contraceptivo de longo prazo que libera hormônios no organismo da mulher.
Os cientistas têm testado a novidade em tilápias. Por isso, encapsularam bactérias causadoras das duas principais doenças que mais matam essa espécie. “Uma delas provoca uma infecção generalizada que acaba causando uma hemorragia e a outra provoca meningite.
Ainda é um grande problema sanitário e que causa grandes prejuízos para os criadores”, ressalta o professor Marco Belo, orientador do estudo. Além de encapsular as bactérias inativadas, também foi testada uma segunda técnica, na qual os microrganismos foram separados em pedaços. “A resposta do sistema imunológico tem sido melhor quando adicionamos partes específicas das bactérias no dispositivo. O polímero com as bactérias divididas causam uma produção de anticorpos em maior quantidade”, conta.
Gabriel Conde, que é médico veterinário e já trabalha há seis anos no desenvolvimento da inovação, lembra que o método de vacinação atual provoca muito estresse no peixe a ponto de poder levá-lo à morte. “É um trabalho muito grande fazer a imunização desses animais.
O ideal é fazer esse procedimento apenas uma vez e que a imunidade seja longa para que os produtores possam manter suas criações saudáveis e seguras”, afirma. Como o novo dispositivo pode durar até dois anos dentro do animal, os peixes não precisariam ser vacinados novamente ao longo da vida, garantindo menos gastos para o produtor e, consequentemente, barateando a carne que seria vendida no mercado.
O professor Marco Belo explica que ao longo de oito meses foram realizados testes de segurança clínica e toxicológica, bem como avaliação da reação inflamatória causada pelo implante e nenhum impacto negativo na saúde dos animais foi identificado. “Em avaliações com o microscópio eletrônico vimos que o polímero estava se degradando. Ou seja, a liberação estava acontecendo. Agora, o Instituto Butantan tem analisado a quantidade de anticorpos produzidos pelos peixes.
Captamos amostras do sangue e mandamos o soro para avaliação. Após 28 dias da aplicação da vacina, nós já conseguimos ver um aumento muito significativo. Isso nos deixa muito animados. Também tivemos análises renais e hepáticas com resultados promissores.”, diz orgulhoso. Além disso, novos testes de segurança mais profundos têm sido realizados pelos pesquisadores, em Jaboticabal e em São Paulo.
Os cientistas ainda irão acompanhar por mais alguns meses a resposta dos animais à vacinação com o novo dispositivo. Eles estão abertos ao interesse da indústria e a possíveis parcerias para acelerar o desenvolvimento da tecnologia e sua chegada ao mercado.
Sobre a AUIN – A Agência Unesp de Inovação realiza estudos de viabilidade das invenções dos pesquisadores da Universidade, atua na proteção do patrimônio intelectual e nos trâmites necessários para gestão de patentes. Assim, o órgão é responsável por negociar parcerias e transferir tecnologia da universidade para os setores empresariais e sociais por meio de licenciamentos.
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Fonte: Eduardo Sotto Mayor, da Fontes Comunicação Científica, para a AUIN