Consórcios forrageiros usados em segunda safra melhoram o solo e elevam produtividade de soja
Alternativas para rotação de culturas na segunda safra em sistemas de plantio direto na palha e em sistemas de integração lavoura-pecuária, os consórcios forrageiros contribuem para melhoria de atributos químicos e físicos do solo.
Pesquisas realizadas na Embrapa Agrossilvipastoril (MT) em parceria com a Universidade Federal de Mato Grosso, campus Sinop, (UFMT) indicaram melhor ciclagem de nutrientes, manutenção da porosidade do solo e acúmulo de carbono. A consequência é aumento na produtividade da soja semeada na sequência.
Ao longo dos anos, pesquisadores da Embrapa e professores da UFMT estão avaliando diversos tipos de consórcios, sempre com a presença de um capim mais uma outra espécie, ou ainda uma opção de consórcio múltiplo, com seis espécies. Todos são semeados após a colheita da soja.
De acordo com o professor da UFMT Arthur Behling, para um bom sistema de plantio direto, é necessária a produção de cinco toneladas anuais de matéria seca por hectare. Nesse quesito, todos os consórcios avaliados superaram em muito a meta. Destaque para as combinações de Paiaguás com nabo forrageiro, com 14,2 t/ha a e o consórcio sêxtuplo, com 14,08 t/ha a cada ano. A maior parte dessa matéria seca é composta pelas braquiárias, oscilando de 76% no consórcio de feijão-guandu Iapar 43 com Paiaguás a 100% no consórcio de Piatã com trigo mourisco.
“As amostras são coletadas em agosto, quando as outras espécies fecharam ciclo. Por isso é importante o manejo correto do capim, respeitando, principalmente, sua taxa de semeadura. Uma vez que é o capim que vai garantir a palhada em todo o período seco, inclusive pensando no plantio direto da soja” afirma Arthur.
As espécies utilizadas
O capim ruziziensis é usado em consórcios com Crotalaria ochroleuca, Crotalaria spectabilis ou em um mix sêxtuplo com a presença de feijão-guandu, C. ochroleuca, nabo forrageiro, níger e trigo mourisco. Outros quatro consórcios são formados pela dupla entre a braquiária BRS Paiaguás e feijão-guandu Iapar 43, ou feijão-guandu Super N, ou nabo forrageiro, ou girassol. Há ainda outras quatro combinações usando a braquiária BRS Piatã com níger, ou trigo mourisco, ou Crotalaria breviflora ou o feijão-caupi (Sistema Gravataí).
Acúmulo de carbono
Os pesquisadores também analisaram a taxa de incremento carbono orgânico no solo em cada consórcio. De todos os tratamentos pesquisados, somente aquele com uso do feijão-guandu Super N apresentou redução na quantidade de carbono. Todos os demais tiveram saldo positivo, ou seja, estocaram carbono. No caso do consórcio com girassol, por exemplo, foram estocados 600 kg de carbono por ano na camada de 0 a 20 cm do solo. Como comparação, foi avaliada uma área testemunha cultivada com a sequência soja-algodão. Nesse caso, houve redução anual no estoque de carbono em mais de 600 kg/ha.
“Estamos conseguindo mostrar que temos como produzir soja no bioma Amazônia aportando carbono no solo”, destaca o professor da UFMT Onã Freddi.
Em termos de produtividade de soja, todos as áreas precedidas por consórcios apresentaram valores superiores à área testemunha. Enquanto a sequência soja-algodão resultou em produtividade média abaixo de três mil quilos por hectare, todos os consórcios ficaram acima de 3,2 mil kg/ha, sendo que os consórcios sêxtuplo, com nabo forrageiro, com feijão-caupi e com girassol tiveram produtividades acima de 3,8 mil kg/ha.
“A produtividade está correlacionada à produção de massa seca do consórcio. Onde houver maior produção de matéria seca, maior será a produtividade da soja e maior será o incremento de carbono no solo. Isso mostra que esses três fatores andam juntos”, conclui o professor da UFMT.
Ciclagem de nutrientes
Ao se utilizar nos consórcios plantas de diferentes espécies e famílias botânicas, os pesquisadores buscam diversidade no comportamento de raízes e na exploração do solo. Raízes dos capins, por exemplo, alcançam camadas mais profundas, acessando nutrientes que não são alcançados pela cultura agrícola. Outras plantas possuem a capacidade de ciclar nutrientes, disponibilizando-os para a lavoura cultivada na sequência.
De acordo com o professor Arthur Behling, as pesquisas demonstraram pouca quantidade de fósforo na palhada dos consórcios. Já o nitrogênio esteve presente em quantidades acima de 15 kg/ha nos consórcios de ruziziensis com Crotalaria spectabilis (foto abaixo) e no consórcio sêxtuplo.
“Com relação ao potássio, a gente pôde ver que o consórcio do nabo forrageiro com o capim Paiaguás e do Piatã com feijão-caupi e com trigo mourisco conseguiram obter mais de 340 kg/ha. Um valor muito expressivo, que mostra o potencial de ciclagem de nutrientes desses consórcios”, analista Behling.
Na parte de física do solo, após três anos de avaliação, os dados mostram que o solo mantém boa porosidade total nas camadas de 0 a 10 cm, 10 cm a 20 cm e 20 cm a 30 cm em quase todos os consórcios. Embora a área da pesquisa não estivesse compactada antes do início do cultivo dos consórcios, as análises foram comparadas com a testemunha com algodão, na qual houve revolvimento do solo em todos os anos. De modo geral, o solo onde foram plantados os consórcios tiveram comportamento semelhante ao do solo revolvido.
Os consórcios sêxtuplo, com feijão-caupi e nabo forrageiro se destacaram, com melhores índices de macroporosidade e menor resistência à penetração. Já os consórcios com as crotalárias tiverem os menores índices de porosidade total e maior aumento de resistência à penetração.
No terceiro ano de avaliação, foi feita uma simulação de pastejo por meio da roçagem e retirada da matéria seca. Essa intervenção teve efeito na física do solo, com redução da macroporosidade em todos os consórcios, com exceção do sêxtuplo. Ainda assim, nenhum atingiu índices de compactação que demandem algum tipo de intervenção. De acordo com o professor Freddi, o efeito é resultado da entrada de máquinas para plantio e pulverizações sobre uma menor quantidade de palha.
Alternativas para os produtores
Há dez anos a Embrapa Agrossilvipastoril vem trabalhando em pesquisas e validação de tecnologias para servirem como alternativas para a segunda safra tanto para a produção de palhada para sistemas de plantio direto quanto para pastejo animal em integração lavoura-pecuária.
“Demandas e reclamações provenientes dos produtores rurais em relação à perda da capacidade produtiva dos solos em áreas abertas há mais tempo nos chamaram atenção e nos despertaram sobre a necessidade de trabalhar, dentro do sistema produtivo predominante, com soja na safra, a construção do perfil dos solos”, explica o pesquisador e chefe-adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Agrossilvipastoril, Flávio Wruck.
O objetivo é dar opções ao produtor para cultivo após a safra de soja, de modo a obter serviços ecossistêmicos e possibilitar melhorias de produtividades na lavoura no ano seguinte. Com o uso de consórcios, busca-se não só o aumento da palhada e da matéria orgânica no solo, mas também a ciclagem de nutrientes, descompactação do solo, mitigação de nematoides e mesmo maior ganho de peso animal, quando usada a ILP.
“Para cada problema identificado na lavoura, queremos ter a indicação de pelo menos um consórcio. Daí o produtor define, para suas condições, qual desses consórcios melhor vai atender suas peculiaridades, entendendo que o objetivo principal é mitigar determinado problema”, explica Wruck.
Um exemplo de tecnologia já lançada no mercado é o Sistema Gravataí, que consorcia braquiária com feijão-caupi. A leguminosa aumenta o teor de proteína da dieta animal e, ao fixar nitrogênio no solo, contribui para melhor produtividade tanto da forrageira quanto da soja.
Além das atividades de pesquisa realizadas na Embrapa Agrossilvipastoril, há consórcios sendo testados e avaliados em fazendas. Uma delas é a Fazenda Pontal, em Nova Guarita (MT) e outra é a Fazenda Santana, em Sorriso (MT). Em ambas, os talhões monitorados têm escala maior e seguem o manejo da propriedade. Há ainda uso de outras espécies, como sorgo, milho e outras combinações em policonsórcios.
Na Fazenda Santana as pesquisas fazem parte de um projeto aprovado junto ao REM Mato Grosso. Além das avaliações técnicas, são feitas atividades de transferência de tecnologia, como dias de campo e capacitações de técnicos.